A rosa dos ventos







A rosa dos ventos
Hoje assistimos com horror práticas como a mutilação genital feminina em África, e com razão. Mas o que muitos ignoram é que, por mais de um século, médicos na Europa e América do Norte também cortaram, coseram e removeram partes do corpo feminino... com bata branca e justificação científica.
Levo a mal o tempo que me roubaram quando eu era criança. Fazem isto a todas as crianças: roubam-lhes o tempo que é o tempo delas, e ninguém pestaneja, como pestanejam quando é dinheiro que se rouba. Quando eu queria um canivete para cortar canas, para fazer arcos e flechas, para resistir à invasão do meu quintal, a minha mãe, Diana, prometia-me o canivete que eu quisesse quando eu chegasse à idade para ter canivetes, que era aos 38 anos.
Aos 38 anos, lá comprei todos os canivetes suíços que havia, mas quando entrei no canavial, já me tinha esquecido do que é que eu ia lá fazer. O tempo para as coisas que queremos é quando nos apetece. Que vou eu fazer hoje com todos os desejos infantis que me frustraram?
Falei muito com os meus pais sobre esta campanha concertada de mentiras e falsas promessas que conduziram comigo e com os meus irmãos, mas eles riam-se, satisfeitos por me terem conseguido enganar, dizendo que não tinha sido fácil, como dizem sempre todos os ladrões.
Diziam que esses prazeres foram substituídos por outros mais tardios – como se as cerejas que me apeteciam quando cheguei da praia fossem anuladas pela barrigada de queijo que comi no pequeno-almoço do dia seguinte.
Os apetecimentos, tal como a fome, aparecem no tempo certo para serem satisfeitos. Podemos ser perversos e gulosos, e esperar mais um pouco, na esperança de ficar com mais fome e mais prazer por a matar, mas esse prazo é curto e facilmente se transforma em dor de cabeça.
Como é que as crianças hão-de crescer direitas se estão sempre a ser enganadas? Como hão-de tornar-se honestas se passam a vida a levar com mentiras, sobretudo quando vêem que essas mentiras são bem-sucedidas?
Como é que se vingam todos aqueles tempos roubados, todas aquelas vontades que ficaram por satisfazer, todas aquelas promessas que ninguém tinha a intenção de cumprir? “Há um tempo para tudo”: eis a maior mentira de todas. Na verdade, os tempos para as coisas são muito curtos.
O tempo da infância é um tempo maravilhoso e decisivo. Não só é na infância que se constroem os sonhos, mas também as memórias. Por isso, mais importante do que os brinquedos, são as pessoas que os oferecem. Um dia, os brinquedos já não estarão, um dia, será perdido o rasto do chorão careca e não saberemos qual o caminho que a bola levou que nos fez saltar muros e chamar os amigos para jogar. O tempo é a mais preciosa oferta. Por isso, mais importante do que a bicicleta, é o passeio em conjunto. Mais importante do que o livro, é lê-lo juntos. Mais importante do que a fita do cabelo, é fazer a trança. Mais importante do que o filme, de que esquecermos o título, é a aventura de cada dia. Aquilo que é hoje um dia será memória. Tão triste como uma vida sem futuro, é uma vida sem recordações. Quer para uma como para outra, o que interessa é o presente. Vivido intensamente.
A Costa dos Esqueletos, localizada no noroeste da Namíbia, é uma das regiões mais inóspitas e intrigantes do planeta. Estendendo-se por aproximadamente 500 km ao longo do Oceano Atlântico, essa faixa costeira é famosa por seus inúmeros naufrágios e pela presença de ossadas de animais marinhos, como baleias e focas, espalhadas pelas praias arenosas.