sábado, 5 de julho de 2025

Afirmar-se enquanto ser autêntico exige um ato de bravura rara, a coragem de não agradar.

 Numa era marcada pela diplomacia superficial e pela estética da aceitação, afirmar-se enquanto ser autêntico exige um ato de bravura rara, a coragem de não agradar. Num mundo onde o valor do indivíduo parece estar diretamente vinculado à sua capacidade de ser palatável aos outros, tornar-se desagradavelmente verdadeiro é quase uma heresia existencial. E, no entanto, é justamente esse gesto que revela a fibra mais nobre da alma, a fidelidade a si mesmo.

O desejo de agradar, embora frequentemente travestido de virtude social, é muitas vezes uma forma dissimulada de servidão voluntária. O sujeito que se modela em função do olhar alheio já não pensa com sua própria cabeça, mas com o reflexo do outro. Ele se desfigura para caber no campo da aprovação, perde sua voz no coro dos aplausos, tornando-se, como diria Kierkegaard, mais um “funcionário da existência”, um ser genérico, sem vértebra espiritual.
Ter coragem de não agradar não é adotar uma postura de confronto estéril, mas sim cultivar uma ética de sinceridade. É preferir o risco da incompreensão à segurança da máscara. É estar disposto a perder a simpatia do outro para preservar a inteireza de si. Tal coragem não nasce da arrogância, mas da integridade. Implica suportar o peso de ser mal interpretado, rejeitado, talvez até odiado, mas jamais corrompido.
Nietzsche, em sua genealogia dos valores, já denunciava o caráter ressentido da moral do rebanho, que sacrifica a exceção em nome da harmonia coletiva. O espírito livre, ao contrário, afronta o consenso, recusa o conforto do conformismo e, por isso mesmo, desagrada. Ele desagrada porque pensa, e pensar, verdadeiramente pensar, é sempre uma perturbação. A autenticidade é, nesse sentido, um escândalo moral para uma sociedade moldada pela imagem e pela performance.
A coragem de desagradar é também uma forma de amor. Amor pelo que se é, não pelo que se espera ser. É uma recusa da hipocrisia estética que transforma sujeitos em personagens e relações em trocas de utilidade. Desagradar pode ser um ato de respeito, respeito pela verdade, pela coerência, pela lucidez. Só pode dialogar verdadeiramente aquele que aceita o risco do conflito, pois o diálogo não é o espaço da diplomacia, mas da alteridade.
Há uma solidão inevitável nesse caminho, mas não uma solidão estéril. É a solidão fecunda dos que não trocam sua alma por aceitação. Dos que, como Simone Weil, sabem que “a atenção pura é uma forma de oração”, e que essa atenção começa por si, pela escuta silenciosa da própria consciência.
Por fim, é preciso lembrar que agradar pode ser fácil, mas permanecer é raro. E só permanece aquele que teve a coragem de, em algum momento, desagradar. Pois quem vive para agradar, nunca será lembrado com verdade, apenas com simpatia, essa forma pálida de memória.
Oliver Harden

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