sábado, 3 de maio de 2025

Oliver Harden - O aquário humano!

 Certa vez, a banda Pink Floyd, com a lucidez quase mística que apenas os poetas do abismo alcançam, escreveu: “Somos apenas almas penadas, nadando em um aquário, ano após ano, correndo sobre o mesmo velho chão. E o que nós encontramos? Os mesmos velhos medos.” Há, nessa imagem pungente, uma denúncia ontológica do cárcere invisível onde se debatem as almas humanas. O aquário, metáfora translúcida da prisão moderna, é espaço de contenção sem grades, onde se move, com liberdade aparente, um ser que jamais tocará o oceano.

Essa cena simbólica concentra, com brutal delicadeza, a experiência da existência enclausurada no tempo, repetitiva em sua estrutura, e trágica em sua consciência. O homem moderno, exilado de todo sentido transcendente, convertido em um fragmento consciente de sua própria inutilidade cósmica, nada como um espectro em águas previsíveis. Ele repete gestos, repete rotas, repete afetos, e tudo isso sob o olhar mudo de uma realidade que o cerca como vidro, mas que ele não ousa romper.
Corremos, como diz a letra, sobre o mesmo velho chão, chão do trabalho alienado, dos desejos fabricados, das verdades pasteurizadas. E ao fim da corrida, quando o fôlego escapa e a alma estilhaça, o que nos espera? Os mesmos medos de sempre, medo da morte, medo do abandono, medo de sermos quem somos, medo do silêncio entre uma palavra e outra, medo do espelho.
A angústia que emana dessa percepção não é patológica, mas estrutural. Como diria Kierkegaard, o homem é um paradoxo ambulante, um entrelaçamento de finitude e infinitude que, ao tomar consciência de si, treme. Mas o que Pink Floyd nos oferece não é apenas a angústia do ser, é também a denúncia da repetição, esse “eterno retorno do mesmo”, que Nietzsche via como a mais cruel provação para o espírito livre.
O aquário, então, é também o espetáculo do mundo. E nós, figuras pálidas do drama existencial, nos iludimos com cada volta como se fosse a primeira, como se houvesse alguma novidade no tédio, algum frescor na rotina. A cada ciclo, no entanto, voltamos ao ponto de partida, e descobrimos que a partida nunca foi real, porque jamais saímos de nós mesmos.
Eis o maior dos temores, que a liberdade seja ilusão, que o tempo seja um labirinto circular, que a alma, ao invés de destino, seja apenas eco.
Essa reflexão, evocada por um simples verso de uma canção, nos obriga a perguntar, existe alguma forma de escapar do aquário? Seria a arte, a filosofia, ou o amor, o gesto de nadar contra o vidro até fazê-lo estilhaçar? Ou estaremos eternamente condenados a essa coreografia da repetição, onde cada passo nos devolve ao mesmo chão, e cada esperança reencontra os mesmos medos?
Talvez o primeiro gesto de libertação seja esse, reconhecer que o aquário existe, e que a água que nos sustenta, também nos prende.
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D. Dinis - a nossa língua!

 REI D. DINIS, O PRINCIPAL PIONEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA

Língua e Filosofia Portuguesa na 1ª Universidade do País
Poeta de grande sensibilidade, D. Dinis entendeu a criatividade linguística e filológica da fala e da poesia do povo português, tomando consciência da autonomia e originalidade da nossa língua. Daí, sem dúvida, a sua iniciativa de ordenar que todos os documentos oficiais deixassem de ser escritos em latim para o serem em português.
Com este édito, com a sua própria poesia (o mais importante núcleo lírico da nossa Idade Média, nas suas 138 canções de vários géneros), com o estímulo constante ao surgimento de uma literatura de língua portuguesa, de que é modelo o romance de Amadis de Gaula, de João e Vasco da Lobeira, que Cervantes considerou o melhor de todos os livros que neste género se compuseram, sendo a única obra que D. Quixote salvou da fogueira a que lançou todos os outros romances de cavalaria, o Rei deu à língua portuguesa, definitivamente, a sua personalidade e a sua autonomia face às outras línguas ibéricas, em especial a castelhana, ao mesmo tempo que abria para o futuro as perspectivas do seu enriquecimento.
A Universidade Portuguesa, uma das mais antigas da Europa, fundada pelo rei D. Dinis, dava um maior ênfase ao aluno do que ao professor, isto é, mais no aprender e num querer aprender livre e activo do que numa atitude passiva, mais vinculativa a um ensino ex-cátedra.
"A universidade tradicional portuguesa nasceu e desenvolveu-se de raiz vincadamente discente", escreveu Afonso Botelho.
No Estudo Geral de D. Dinis, como aliás em todas as universidades europeias, se ensinavam grandes autores e filósofos de sangue luso: apontemos antes de todos Paulo Orósio, o bracarense discípulo de Santo Agostinho, autor da Primeira História Universal de sentido filosófico; depois, o lógico e aristotélico Pedro Julião ou Pedro Hispano, mestre da Summa Logicales, adoptada por todo o lado, que viria a ser o papa João XXI; e ainda, entre outros, pensadores como João de Deus, Álvaro Pais e frei João de Alcobaça.
A universidade de D. Dinis, com a primazia espiritual dos cistercienses, orientava-se principalmente pela filosofia de Aristóteles, Santo Agostinho e da Patrística”.
A língua revela o pensamento de um povo, seu espírito e mentalidade; ela é consequência do contacto que os seres humanos têm com os universais (a verdade interior). Portanto, quanto mais contacto um povo tiver com as Ideias Divinas em seu interior, mais próxima delas será a sua verbalização.
O português é a língua que melhor se vem adaptando aos conceitos universais – essa filosofia da lusofonia, baseada nas línguas latina e grega e adaptada à mente universal, criou vocábulos que são únicos; por exemplo, a palavra Saudade.

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Definir saudade?

Definir saudade? 0 Não consigo. É dos sentimentos mais avassaladores que existem. Como se descreve o vazio? O silêncio? A ausência? O pedaço de nós que se ausentou?
Saudades não é só sentir falta de alguém. É sentir a falta de alguém em nós. Dentro de nós. É ter saudades de nós com alguém. É o estar por estar, e o ser por ser.
Como se traduz em palavras aquilo que a saudade corta sem nada nos tocar. Que fere. Que magoa. Que esvazia. Que ecoa. Que enlouquece.
Nada disto se assemelha à saudade que sinto. São pequenas as palavras que a descrevem.
Definir saudade? Não me é possível. Talvez por a sentir tão em mim. Talvez, porque me toque na pele todos os dias. Saudades. Infindas. Sempre!”
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sexta-feira, 2 de maio de 2025

José Malhoa

 Um dos grandes nomes da pintura em Portugal e expoente do Naturalismo, José Malhoa nasceu nas Caldas da Rainha, a 28 de Abril de 1855, e faleceu em 1933, em Figueiró dos Vinhos.

Contemporâneo de Silva Porto e Columbano Bordalo Pinheiro, com os quais integrou o chamado “Grupo do Leão”, Mestre Malhoa empenhou-se, apaixonadamente, na representação de paisagens bucólicas, expressões humanas e cenas da vida rural e urbana, enfatizando, com visceral realismo e teatralidade, rituais de trabalho, festivos ou religiosos, assim como ambientes boémios.
Intérprete dos costumes e tradições, da gente simples e humilde, o “pintor do povo” destacou-se, também, como autor de retratos, captando a aparência e a personalidade de figuras históricas portuguesas, desenvolvendo, por outro lado, uma poética intimista em trabalhos que estabeleceram a ponte entre a tradição académica e a sensibilidade impressionista e contemplativa da belle époque.
O seu legado na renovação da pintura portuguesa estendeu-se, ainda, ao ensino e na qualidade de presidente da Sociedade Nacional de Belas Artes.
“O fado”, “Os bêbados”, “Clara”, “Ilha dos amores”, “Outono”, “Praia das Maçãs”, “As promessas” ou “Conversa com o vizinho” atestam a versatilidade pictórica e a qualidade plástica de uma obra marcada por cores fortes e luminosa autenticidade.
Na sua cidade natal (Caldas da Rainha), pode ser visitado o Museu José Malhoa, dedicado à vida e obra do pintor e desenhista.
José Augusto-França, figura maior da História da Arte em Portugal, publicou, na Imprensa Nacional, “O essencial sobre José Malhoa”, título disponível para leitura e descarga gratuitas em https://imprensanacional.pt/.../O-Essencial-Sobre-Jose...
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