sábado, 28 de junho de 2025

Uma boa sandes de fiambre!

 

É pena ser tão difícil fazer uma boa sandes de fiambre

Lembro-me — ou, melhor, não me consigo esquecer, por muito que me convenha — da melhor sandes de fiambre que comi.

Foi no dia em que, pela primeira vez, me senti um homem.

Vinha do Louvre, onde tinha acariciado a nádega direita da Vénus de Milo.

Nesse momento, percebi a força da escultura.

Cheio de fome, depois dos quilómetros que atravessei, fui à procura de um café barato.

“O que é que quer comer?” Trataram-me como um homem. Foi como se os meus catorze anos tivessem desaparecido para sempre.

Vi os preços e calhei no mais baixo, um “jambon-beurre”, que pensei ser um prato de pernil com molho de manteiga, possivelmente cercado de batatas assadas e servido com uma boa salada à parte.

Mas não: era só uma sandes de fiambre.

O homem cortou uma baguette estaladiça ao meio — só o ruído é suficiente para pôr as glândulas salivares em sentido — barrou ambos os lados com uma grande desfaçatez de manteiga, e finalmente recheou aquilo tudo com várias fatias grossas de fiambre.

Embrulhou-a numa folha de papel até meio e passou-me para a mão.

“Vinho?”

“Claro”, respondi eu, que nunca tinha pensado em acompanhar uma sanduíche de fiambre com um copo de tinto.

Mas acompanhei — e agradeci. No dia seguinte, comprei uma baguette acabada de cozer, meio pacote de manteiga barata e 100 gramas de fiambre do pior.

Fiz tudo como tinha visto. E ficou bom. Mas não tinha nada a ver com o “jambon-beurre” da véspera.

55 anos depois, acho que já percebi porque é que o “jambon-beurre” é tão bom.

Em primeiro lugar, o pão é cozido de hora em hora, para haver sempre baguettes estaladiças.

Isto representa uma escolha e um sacrifício.

É que a baguette é concebida para durar só uma hora. E não só: só é realmente boa quando sai do forno e descansa 4 a 5 minutos.

Depois, fica dura e intragável. Os parisienses vêem as baguettes como farturas. São para comer mal ficam prontas e, como tal, têm de se ir fazendo.

Em Portugal, o pão que se faz todo o dia — o pão que se anuncia como “quente” — não presta para nada, e o pão bom é aquele que dura o dia inteiro, para não dizer a semana.

Restam duas hipóteses: a velha carcaça, acabada de sair de um forno de lenha, e o pão-de-forma, feito só com farinha, água, fermento, sal e um nadinha de manteiga, acabado de sair dum forno qualquer, ou até de uma máquina de pão.

Um “jambon-beurre” é uma conjunção de três delícias: pão, manteiga e fiambre. Todos têm de ser bons e servidos com generosidade e indiferença médica.

Um “jambon-beurre” é comprido. É um almoço. Come-se ao meio-dia, de pé, encostado a um balcão de zinco, de preferência com um fato-macaco de sarja.

Passemos à manteiga. Tem de ser muita e tem de ser boa. Os franceses tratam a manteiga como um queijo. Fazem questão de indicar a região. Quem não conhece dez manteigas diferentes não é gente.

Um “jambon-beurre” é, na verdade, uma sanduíche de queijo, em que o queijo é uma manteiga consagrada.

Não precisa de mais nada.

Mas aí está o luxo: ao enchê-la com fartas fatias de fiambre, o francês está a demonstrar que duas coisas muito boas não dispensam uma terceira coisa muito boa.

O fiambre é um exagero. Mas é um exagero à Luís XIV: o fiambre tem de ser do melhor, como se o pão e a manteiga não prestassem e fosse preciso compensar.

É importantíssimo saber que o fiambre que se come num “jambon-beurre” parisiense também é parisiense.

Toda a gente compra esse fiambre de Paris, a que chamam fiambre branco. Compreendem que é uma raridade. Compreendem que é um luxo. Compreendem que é uma gracinha.

Juntem-se estas três qualidades — o luxo, a raridade, e a gracinha — e compreender-se-á o espírito parisiense.

No fundo, um “jambon-beurre” é uma sandes mista, com queijo redobrado e fiambre redobrado, em pão redobrado, em que o queijo é aquele queijo que fica melhor com fiambre: a manteiga.

Os franceses não têm vergonha da gordura. E nós, se não nos apressarmos a ficar horrorizados com tanta gordura, deveríamos pensar nas buchas de pão com toucinho, ou nas fatias gordas de pata negra, apanhadas por um vestigiozinho de pão.

Por isso é que não se pode fazer uma boa sandes de fiambre em Portugal: falta-nos o fiambre.

A nossa versão deliciosa é com pão de forma, manteiga, e fatias muito fininhas de fiambre.

Mas também nos falta a atitude. Porque não temos sandes de perna de borrego, ou de pernil, fatiadas mesmo antes de saltar para o pão acabado de cozer, feitas com fartura de manteiga da boa? A bem ver, só nos falta a vontade. Logo por azar, é a coisa mais difícil de todas.

O peso das nossas memórias!

 

Saudades fresquinhas

O passado está sempre a fazer-nos um favor: o favor de se esconder. Se cada dia que vivemos tinha indiscutivelmente 24 horas — e se uma hora já de si é muito tempo —, que faríamos nós com o peso dessas memórias? Como conseguiríamos dar um passo, se a cordilheira de montanhas de tantos momentinhos quisesse encavalitar-se nas nossas costas, doida para seguir caminho connosco?

Dizem que só usamos um terço do nosso cérebro. Acho que sei porquê: os outros dois terços estão ocupados com limpezas.

Os outros dois terços encarregam-se do esquecimento. Na verdade, os outros dois terços não são outros, coisa nenhuma. O terço que resta é que é outro. Os dois terços é que fazem o trabalho principal do cérebro, que é esquecer. E sonhar.

Esquecer é limpar. Esquecer é arrumar. Esquecer é arranjar espaço. É preciso espaço para as visitas: as visitas da imaginação e das dúvidas, as visitas da novidade e da frescura.

Lembrar é um grande compromisso. Os grandes horrores já nos esforçamos por esquecer. Mas também temos de nos esquecer da quantidade imensa de alegrias medíocres e de chatices um bocadinho de nada divertidas com que, para não morrermos de tédio, conseguimos encher as nossas vidas.

Lembrar é uma honra. Com um passado devidamente esquecido e desprezado, só aparecem as memórias curiosas. Acordo e pergunto: que memória vem ter comigo hoje? De onde veio? Ou, mais importante: o que é que vem cá fazer? Como é que se está a dar com o presente circundante? Está a integrar-se? Ou está a tentar arranjar briga?

Se a cabecinha estiver a esquecer como deve ser — a esconder bem as tralhas todas que foi acumulando só por força de estarmos vivos —, o outro terço poderá ocupar-se com a escolha livre de memórias interessantes, de memórias úteis, que nos ajudam.

Como chegaste aqui, memória, vinda sabe-se lá de onde, com o teu atrevimento de te candidatares a saudade? Não sabemos como nem porquê. Ainda bem. Só sabemos que gostou de ter o caminho desimpedido.

Novos casais com mais de 60 anos

 Um estudo analisou novos casais com mais de 60 anos e a conclusão é clara: eles são mais felizes se moram em casas separadas

Todos conhecemos casais jovens que vivem separados, um estilo de vida que agora também começa a ser adotado por adultos com mais de 60 anos — e que pode ser mais benéfico do que imaginamos. De acordo com um estudo conduzido pela Universidade de Lancaster e pelo University College London, esse modelo de relacionamento entre pessoas com mais de 60 anos pode trazer benefícios à saúde mental.
Segundo a pesquisa, os chamados relacionamentos LAT (do inglês Living Apart Together), também conhecidos como relacionamentos sem coabitação, oferecem um equilíbrio entre união e autonomia. Eles podem ser uma boa opção tanto para quem está começando um relacionamento nessa fase da vida quanto para quem já está em uma relação de longo prazo.
Trata-se de uma alternativa que permite manter compromissos pessoais e familiares, sem abrir mão da conexão íntima com o parceiro.
Um estilo de vida que beneficia especialmente as mulheres
Relacionamentos LAT são especialmente bem recebidos por mulheres heterossexuais. De acordo com o estudo, quando uma mulher com mais de 60 anos inicia um relacionamento, a chance de ele evoluir para um modelo LAT é 10 vezes maior do que para coabitação ou casamento. Já entre os homens mais velhos, a probabilidade de optar por morar com a parceira é quase 20 vezes maior. O que explica essa diferença?
Em relacionamentos heterossexuais, as mulheres costumam assumir uma parte maior das tarefas domésticas e dos cuidados quotidianos quando vivem com um parceiro. Por isso, esse estilo de vida tem sido apontado como mais vantajoso para elas.
Embora, historicamente, tenha havido uma valorização da construção de um lar como modelo ideal de relacionamento, se considerarmos o bem-estar emocional, talvez seja hora de repensar: será que devemos continuar nos moldando às construções sociais ou seria o caso de adaptá-las às nossas necessidades?
Como destaca o estudo, tanto mulheres quanto homens com mais de 60 anos em relacionamentos duradouros se beneficiam, em termos de saúde mental, de viver em casas separadas. Os ganhos desse estilo de vida para o bem-estar emocional estão se tornando cada vez mais claros — e, por isso, têm sido adotados por um número crescente de casais mais velhos.
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Lisboa ao entardecer.

 A fotografia capta uma atmosfera única e poética de Lisboa, ao entardecer. Um beco estreito e calçado de pedras irregulares conduz o olhar por uma escadaria antiga, enquanto as fachadas revestidas de azulejos e janelas com flores vermelhas tornam a cena tão viva e autêntica. Os lampiões de ferro fundido iluminam a calçada com uma luz dourada e quente, refletida nas pedras, enquanto o sol, prestes a desaparecer no horizonte, tinge o céu de tons alaranjados e rosa. É uma imagem que exala nostalgia e magia, como um convite a subir cada degrau e perder‑se nos caminhos antigos desta cidade tão cheia de alma.

Lisboa não é uma simples cidade, mas uma poesia viva escrita nas suas colinas, azulejos e miradouros. À noite, o seu casario reluz sob a luz dourada dos lampiões e o clima ameno exala o cheiro do Tejo e das pedras quentes. Os elétricos sobem e descem as suas colinas, enquanto as varandas parecem guardar segredos de tempos passados. Lisboa respira saudade e alegria ao mesmo tempo, uma cidade feita de caminhos tortuosos e praças abertas, de sons de guitarra portuguesa e ecos de uma história viva. Visitar Lisboa não é só conhecer uma cidade, mas sentir‑se abraçado pela magia de uma terra antiga e tão viva.
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O Novo Jet Set - uma presença digital

 O Novo Jet Set

Durante boa parte do século XX, o termo "jet set" era usado para descrever uma elite internacional de ricos e famosos, que cruzavam o globo em jatos particulares, frequentando festas exclusivas, resorts de luxo e eventos badalados. Era um grupo reconhecido pelo glamour, pela ostentação e pelo estilo de vida inatingível, muitas vezes imortalizada por revistas e colunas sociais.
Hoje, o "novo jet set" é configurado de forma bastante diferente, mais digital, mais influente e, em certos aspetos, mais acessível (ou, aparentando ser). O novo jet set é composto por uma elite global que não se define apenas pelo dinheiro, mas pelo alcance, pela relevância e pela capacidade de moldar narrativas no mundo digital. Influenciadores, empreendedores de tecnologia, artistas de media, criadores de conteúdos, e até mesmo nómadas digitais com grandes audiências, formam esta nova constelação de poder. Podem não ter heranças milionárias, mas têm seguidores, influência cultural e visibilidade transnacional.
Enquanto o jet set clássico exibia status por meio de consumo e presença em espaços exclusivos, o novo jet set valoriza experiências, liberdade geográfica e capital simbólico. Estão menos nos salões de gala e mais nas conferências globais, em retiros de bem-estar em Bali, ou documentando as suas rotinas em Tóquio, Lisboa ou Dubai. Não é raro que sua vida pareça simultaneamente distante e íntima. As suas viagens são compartilhadas em tempo real, os seus pensamentos estão em podcasts, os seus negócios são discutidos no X (Twitter), e a sua estética molda tendências mundiais via Instagram ou TikTok.
Contudo, essa nova elite também enfrenta críticas. A aparente informalidade e autenticidade mascaram, muitas vezes, estruturas de privilégio e exclusão, similares às do antigo jet set. Além disso, o culto da produtividade, da performance e do "lifestyle" perfeito, podem gerar pressões psicológicas tanto para quem consome como para quem produz essa imagem. A desigualdade continua presente, apenas mais camuflada sob filtros e narrativas de meritocracia digital.
O novo jet set representa, assim, uma transformação no imaginário de sucesso e mobilidade global. É menos sobre luxo explícito e mais sobre acesso simbólico, influência cultural e presença digital. Ainda assim, agora, há uma elite que se mantém, não apenas nas primeiras classes dos aviões, mas nos algoritmos, nas tendências e no imaginário coletivo.
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Por que as pessoas gritam?

 Por que as pessoas gritam?

Um dia, um pensador indiano fez a seguinte pergunta aos seus discípulos:
- Por que as pessoas gritam quando estão aborrecidas?
- Gritamos porque perdemos a calma, disse um deles.
- Mas, por que gritar quando a outra pessoa está ao seu lado? – Questionou novamente o pensador.
- Bem, gritamos porque desejamos que a outra pessoa nos ouça, returquiu outro discípulo.
E o mestre volta a perguntar:
- Então não é possível falar-lhe em voz baixa?
Várias outras respostas surgiram, mas nenhuma convenceu o pensador. Então ele esclareceu:
- Vocês sabem porque se grita com uma pessoa quando se está aborrecida? O fato é que, quando duas pessoas estão aborrecidas, os seus corações afastam-se muito.
Para cobrir esta distância precisam gritar para poderem escutar-se mutuamente.
Quanto mais aborrecidas estiverem, mais forte terão que gritar para ouvir um ao outro, através da grande distância.
Por outro lado, o que sucede quando duas pessoas estão enamoradas?
Elas não gritam. Falam suavemente.
E por quê?
Porque os seus corações estão muito perto.
A distância entre elas é pequena.
Às vezes estão tão próximos os seus corações, que nem falam, somente sussurram.
E quando o amor é mais intenso, não necessitam sequer sussurrar, apenas se olham, e basta.
Os seus corações entendem-se.
É isso que acontece quando duas pessoas que se amam estão próximas.
Por fim, o pensador conclui, dizendo:
“Quando vocês discutirem, não deixem que os vossos corações se afastem, não digam palavras que os distanciem mais, pois chegará um dia em que a distância será tanta que não mais encontrarão o caminho de volta”
Mahatma Gandhi

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