Fim do namoro levou a mais agressões e a mais pedidos de ajuda à APAV
- Público - Edição Lisboa
- Joana Gorjão Henriques
Violência no namoro
Pela primeira vez, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) compilou dados sobre a violência no namoro, e a conclusão foi que, em 2024, o número de vítimas após a ruptura da relação foi mais do que o dobro registado durante a relação, ou seja, a violência não termina necessariamente com o fim da relação.
Do total de 1023 vítimas de violência no namoro apoiadas pela APAV, 691 já tinham terminado a relação, mas ainda continuavam a ser alvo de violência, e 332 ainda estavam na relação. Os dados não têm comparativo com anos anteriores, pois esta foi a primeira vez que a APAV desagregou esta estatística do total de vítimas que tem registado anualmente. A violência no namoro está enquadrada no crime de violência doméstica.
Além disso, a percentagem de quem fez denúncia a outras entidades antes de procurar a APAV foi maior nos casos pós-ruptura — quase 60%, comparando com 45,2% durante a relação. Isso pode sugerir que as vítimas se sentirão mais seguras para denunciar e procurar apoio depois de se distanciarem da relação abusiva. Não há, porém, informação específica sobre o tipo de violência sofrida por estas vítimas. Os números de 2024 relativamente ao apoio da APAV a vítimas de vários tipos ainda não estão apurados, mas as de violência doméstica têm vindo a aumentar: em 2021 foram 9275, em 2022 10.442, e em 2023 foram 11.400.
Os dados compilados pela APAV diferenciam as relações de namoro de acordo com o que foi especificado pelas vítimas, esclarece ao PÚBLICO
Patrícia Ferreira, do gabinete de apoio à vítima do Cadaval — ou seja, os casos considerados foram exclusivamente aqueles em que a agressão ocorreu dentro de uma relação de namoro, em que não havia coabitação.
Tanto no caso de vítima de violência durante a relação de namoro, quanto depois da ruptura, verificaram-se padrões semelhantes. A maioria das vítimas eram mulheres (quase 90% nos dois casos), seguidas por homens (mais de 11%) e pessoas intersexo (no primeiro caso, 0,3% e, no segundo caso, de 0,1%).
A faixa etária mais afectada nas duas circunstâncias situou-se entre os 18 e os 44 anos, o que revela que a violência no namoro não atinge apenas adolescentes e jovens adultos, mas também pessoas em fases mais avançadas da vida. No caso das vítimas pós-ruptura, quase 72% das vítimas eram portuguesas e 18,5% estrangeiras; nas vítimas durante a relação, 65,1% eram portuguesas e 22% estrangeiras. Lisboa, Porto e Faro foram onde houve mais queixas.
Segundo Patrícia Ferreira, o facto de os dados sobre violência pós-ruptura serem tão altos mostra que muitas vítimas não conseguem, sozinhas, implementar estratégias para se afastar definitivamente do agressor, daí a necessidade de um apoio especializado para que possam romper com a relação abusiva de forma segura e evitar novas situações de violência. Muitas vezes, a violência começa antes da ruptura, mas ganha novos contornos na ruptura por uma das partes não aceitar o fim da relação.
O apoio da APAV é a nível jurídico, para acompanhamento em processos-crime e nos contactos com o sistema de justiça; a nível psicológico e emocional, para lidar com as consequências do trauma e recuperar a autonomia; e a nível prático, nomeadamente no aconselhamento e na criação de estratégias para a segurança da vítima, sublinha a técnica. “A intervenção psicológica estruturada é fundamental para tratar as consequências de terem sido vítimas”, sublinha.
Já sobre as faixas etárias mais atingidas, não são muito diferentes das da violência doméstica em geral — os dados de 2023 mostram que a incidência era numa média de idades entre os 36 e 45 anos. Sobre menores de 17 anos, a recolha feita pela APAV revela que 66 pessoas se queixaram de violência no namoro, 30 durante e 36 depois da ruptura.
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