sábado, 26 de julho de 2025

Educação e valores

 

Educação e valores

Li recentemente uns artigos de opinião da autoria de dois amigos que muito prezo e estimo, em que se defende que a escola não tem como missão transmitir valores. Com toda a sinceridade, não estou de acordo, e não ficaria de bem com a minha consciência se não o assumisse publicamente, embora perceba que nos escritos dos meus amigos o conceito de valores possa ser diferente do que eu utilizo nesta minha reflexão. Passo a explicar porquê.

A missão da escola assenta em três pilares: o ensino dos conhecimentos de base científica; o desenvolvimento de certos comportamentos e atitudes; e a transmissão de valores. Os conhecimentos são os clássicos: línguas (materna e estrangeiras), matemática, história, geografia, física, química, biologia, geometria descritiva, informática nas suas diferentes dimensões e ainda o aproveitamento das aptidões de cada um em expressão plástica e exercício físico.

O desenvolvimento de certos comportamentos e atitudes é indispensável, porque o que hoje mais conta na vida são as capacidades habilitantes que incentivam a liderança, a responsabilidade, o trabalho em equipa, a curiosidade, a inovação e, sobretudo, a proatividade, que constitui a característica fundamental que um candidato deve demonstrar quando se propõe para um lugar numa qualquer organização.

Os valores a transmitir também são fáceis de elencar. São a honestidade, a justiça, o respeito pelos outros, a solidariedade, o sentido da ética, a não-violência na resolução dos conflitos e o respeito escrupuloso pela verdade.

Deverão os professores e as educadoras ser tolerantes com a prática da mentira, como hoje se tolera na vida política? Não deverá ser norma nas escolas corrigir as crianças que retiram os objetos aos colegas e tentar educar aqueles que praticam esse atos? Poderemos não exigir dos professores, dos estudantes e dos familiares um comportamento ético elevado, de forma a evitarem-se os comportamentos menos dignos a que vamos assistindo, quase diariamente, na nossa vida pública? Não será adequado reprimir os comportamentos violentos, designadamente a violência verbal, que ocorrem entre alunos, de forma a prevenirem-se estes atos que hoje parecem ser aceites como normais entre adultos com responsabilidades? Promover o diálogo para a resolução de conflitos não é um valor que deve ser transmitido pela escola? Pode o código de conduta de uma escola permitir que um aluno de pele branca se dirija a um outro estudante chamando-lhe “o preto” ou “o monhé”?

O respeito pelos outros não é um valor que deva ser promovido pela escola? Não deve a escola incentivar a solidariedade entre todos criando grupos de trabalho, equipas e clubes nas mais diversas áreas, a fim de se consolidarem laços e solidariedade entre os seus membros? A solidariedade não é um valor que reforça a coesão social, desenvolve o bom entendimento dos membros de uma sociedade e combate as desigualdades? Poderemos ter uma escola em que se admitem decisões injustas e que acentuam as desigualdades e promovem situações iníquas?

Em resumo: a escola não se substitui à família nem à educação que os pais transmitem aos seus filhos, mas tem a responsabilidade de consolidar a transmissão de valores que devem estar presentes em todos os atos da vida de cada um.

Tive a sorte e o privilégio de frequentar, entre 1945 e 1949, um jardim-escola numa cidade do interior do país. Na década de oitenta, Robert Fulghum publicou nos Estados Unidos um livro cujo título é All I Really Need to Know I Learned in the Kindergarten (Tudo o que realmente preciso de saber aprendi no jardim-escola). Tinha três anos quando entrei pela primeira vez no jardim-escola e considero que tudo o que lá me foi transmitido em matéria de valores completou, e bem, o que me foi transmitido pelos meus pais.

As escolas que não têm a preocupação de transmitir e praticar estes valores não cumprem com a missão que eu entendo que uma escola deve ter. Peço desculpa de o dizer, mas é o que penso. Talvez seja por ter uma formação de engenheiro e não saber nada, nem de sociologia nem de ciência política.

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