Desporto escolar vs. Desporto federado
- Público - Edição Lisboa
- José Manuel Meirim
1. É tema recorrente o das relações entre os dois segmentos em título e dura, pelo menos, desde quando foi publicado o Decreto-Lei n.º 95/91, de 26 de Fevereiro, que aprovou o regime jurídico da Educação Física e do desporto escolar. Autonomia? Desporto escolar como antecâmara do desporto federado? Duas linhas paralelas?
Se mirarmos a lei — esse texto que tudo pretende dizer —, no concreto a Lei n.º 5/2007, de 16 de Janeiro, Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto, temos o artigo 28.º, em especial seus n.ºs 1 e 2: “1 — A educação física e o desporto escolar devem ser promovidos no âmbito curricular e de complemento curricular, em todos os níveis e graus de educação e ensino, como componentes essenciais da formação integral dos alunos, visando especificamente a promoção da saúde e condição física, a aquisição de hábitos e condutas motoras e o entendimento do desporto como factor de cultura. 2 — As actividades desportivas escolares devem valorizar a participação e o envolvimento dos jovens, dos pais e encarregados de educação e das autarquias locais na sua organização, desenvolvimento e avaliação.” Programático, nada mais. Mas a narrativa é bonita.
Se olharmos para o Programa do Governo (outros diriam o mesmo), as palavras continuam a ser bonitas. No espaço “Um País com futuro para os jovens e para as crianças”, há um lugar para o “Desporto e Actividade Física”: “A qualidade de vida é, também, afectada pelos fracos níveis de prática de actividade física e desportiva da população portuguesa, a que acrescem problemas de literacia motora e desportiva. É fundamental melhorar significativamente a prática desportiva em idade escolar até ao ensino superior. Torna-se necessário, hoje mais do que nunca, assumir e impulsionar o desporto como uma ferramenta de inclusão social.”
Também lá estão as santas “sinergias”: “Clarificar competências e potenciar sinergias entre a educação física, o desporto na escola (todos os níveis de ensino), o desporto no clube, as actividades de recreio desportivo de cariz comunitário e o desporto para segmentos populacionais específicos.”
2. Uma história vizinha. No início do ano escolar 2023/2024, um pai procurou inscrever as duas filhas num clube de basquetebol. Porém, o clube negou tal inscrição, sustentando que as meninas não se inscreveram num dado programa — multidesportivo — escolar. O pai requereu então à Diputación de Gipuzkoa que fosse permitida a inscrição no clube, sem necessidade de estarem inscritas no programa escolar, frisando que a actividade se realizaria fora das horas lectivas. A resposta: “A participação das meninas numa escola de basquetebol está subordinada à participação no referido programa do centro escolar.” Foram invocados os riscos de uma precoce especialização e a prossecução do desenvolvimento educativo integral do menor através do desporto. Em suma, a obrigatoriedade de as crianças fazerem desporto na escola é um requisito indispensável para se inscreverem num clube.
3. Quem não concordou foi o Tribunal Superior de Justicia do País Basco. Para o tribunal, de acordo com a Ley del Deporte do País Basco, deve-se garantir preferencialmente a prática multidesportiva, mas nunca a tornar obrigatória. Por outro lado, não são de descartar as preferências dos menores no desenvolvimento da prática desportiva.
4. A história accionou a memória. Dispunha o artigo 1.º do Decreto 11:561, de 7 de Maio de 1926: “Nenhum aluno das escolas dependentes do Ministério da Instrução Pública poderá dedicar-se a práticas desportivas de qualquer natureza sem uma autorização escrita dos chefes dos estabelecimentos em que se encontrem matriculados, declarando-o apto para as realizar.” Segundo o artigo 2.º, a falta da autorização escrita implicava para os alunos que “indevidamente se dedicarem à prática de qualquer desporto a anulação da sua matrícula”. Simpático.
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