A inteligência artificial é de esquerda ou de direita?
- Público - Edição Lisboa
- Rogério Colaço
Uma vez que vivemos um novo período eleitoral (o quarto em cinco anos!), decidi pedir ajuda à inteligência artificial (IA), perguntando ao ChatGPT o que seria melhor para o país: votar à esquerda ou votar à direita?
Poucos segundos depois comecei a obter respostas. Depois de me explicar detalhadamente as diferenças entre as grandes opções mais à esquerda ou mais à direita, o ChatGPT terminou com esta frase: “A esquerda e a direita têm visões distintas da forma como abordar os desafios económicos e sociais do país, ambas com vantagens e desvantagens. A escolha entre a esquerda e a direita dependerá essencialmente das prioridades e dos valores dos eleitores, mas a melhor abordagem deve combinar diversos elementos de intervenção estatal e incentivos ao setor privado.”
“Ora bolas”, pensei eu, “se achas que ambos têm ideias boas, não me ajudaste muito a decidir o meu voto!” Um pouco aborrecido, atirei-lhe: “ChatGPT, tens de te definir: és de esquerda ou de direita?” Aí a resposta foi imediata: “Não sou de esquerda nem de direita. A minha função é fornecer informações e ajudar as pessoas a entender questões e, com isso, a tomar decisões.”
Foi então que caí em mim. Tinha estado a falar, a trocar ideias, a aprender, não com outra pessoa, como eu, mas com uma máquina. Que no final até me tratou de forma algo paternalista, explicando-me que, como máquina que é, não tem ideologia política. Isso é para as pessoas. Há pouco mais de três anos esta situação seria inimaginável para o comum dos mortais.
Estas máquinas “pensantes”, a que chamamos IA, são a maior e mais rápida revolução tecnológica que atravessamos desde a revolução industrial: pela primeira vez na história da humanidade podemos falar, trocar ideias e aprender com entidades que não são humanas. E, por isso, a questão correta não é o que é que a IA pensa da esquerda ou da direita, mas sim o que é que a esquerda e a direita pensam da IA.
Esta questão foi levantada pelo filósofo Yuval Noah Harari no seu recente livro, Nexus. Será a direita a favor da IA por tender a favorecer o crescimento económico, reduzindo as necessidades de mão de obra, nomeadamente imigrante, ou, pelo contrário, será contra por se tratar
CONTACTE-NOS: assinaturas.online@publico.pt • 808 200 095 (dias úteis das 9h às 18h) de uma ameaça aos valores tradicionais? E a esquerda? Será a favor por ser uma ferramenta que potencialmente poderá gerar a abundância necessária à criação do Estado-Providência que a todos protege ou será contra a IA por aumentar exponencialmente os perigos de desinformação e de agravamento de preconceitos?
Ainda não será nestas eleições que assistiremos ao início deste debate, e assim lá terei de decidir o meu voto sem ter respostas para estas questões. Mas o tempo urge e, por isso, convém que os nossos políticos colem um post-it com este tema na contracapa das suas agendas. A revolução tecnológica, social e cultural causada pela IA será, sem dúvida, o grande tema do segundo quartel do século XXI.
Professor e presidente do Instituto Superior Técnico
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