domingo, 9 de fevereiro de 2025

Estudantes universitários e a emigração!

 

Mais de 70% dos estudantes universitários planeiam emigrar

FAP defende valorização salarial, acesso à habitação, mais qualidade de vida e aposta na ciência

Rui Duarte Silva

Estudo revela que um terço dos universitários pondera viver no estrangeiro mais de 10 anos. “Sangria de talento” pode custar 95 mil milhões de euros ao país

06 fevereiro 2025 22:57


André Manuel Correia

Jornalista

“Uma forte sangria de talento.” As palavras são de Francisco Porto Fernandes, presidente da Federação Académica do Porto (FAP), que realizou um estudo para analisar a dimensão do fenómeno da emigração de jovens portugueses qualificados. Os dados, avançados em primeira mão ao Expresso, revelam que 73% dos estudantes universitários inquiridos dão por certo ou ponderam seriamente sair do país após a conclusão do curso.

“A dimensão surpreendeu-nos. Os números são absolutamente brutais”, comenta o investigador e professor Rui Henrique Alves, um dos dois coordenadores do estudo. Os resultados apontam também que 25% dos universitários já tomaram a decisão de procurar um futuro melhor fora de Portugal. Apenas 10% garantem que vão permanecer no país.

De acordo com o investigador, a tendência é mais notória na classe média e em estudantes de mestrado, sendo “transversal a todos os cursos” e “sem grandes flutuações nem por idade nem por género”, embora “os homens valorizem mais a questão salarial e as mulheres se preocupem mais com as condições de vida” quando decidem emigrar.

Reino Unido, Alemanha, Suíça, Países Baixos e Luxemburgo são os países que acolhem mais jovens portugueses com formação superior. Fora da Europa, acrescenta o coordenador do estudo, “Estados Unidos e Canadá são os principais destinos”.

O estudo, realizado pelo Centro de Estudos da FAP e que inquiriu 375 estudantes, com uma margem de erro de 5%, indica que 33% dos estudantes pretendem emigrar durante um período inferior a cinco anos, 36% equacionam uma saída entre cinco e dez anos e quase 30% esperam estar fora de Portugal durante mais de uma década.

Portugal pode perder €2 mil milhões por ano

A Federação Académica do Porto salienta que as consequências da emigração jovem qualificada são “devastadoras” para a economia portuguesa. De acordo com o estudo, este fenómeno poderá resultar em perdas líquidas de mais €95 mil milhões ao longo de 45 anos, o que se traduz em €2,1 mil milhões por ano. “O país perde nos impostos diretos sobre os rendimentos, nos impostos indiretos no consumo e nas contribuições para a Segurança Social”, refere o investigador Rui Henrique Alves. Além disso, Portugal está a desperdiçar capital humano. “O grande impacto que não é calculável é a perda na inovação e que podia transformar o país”, evidencia o presidente da FAP.

“Nunca formámos tantos estudantes no ensino superior e nunca tivemos tão bons quadros. Mas a verdade é que estamos a formar para exportar para os outros países”, adverte Francisco Porto Fernandes. “Portugal gastou mais de €411 mil milhões nesta geração e os nossos melhores estão a sair do país. Isso cria um círculo vicioso”, adianta o dirigente da FAP, para quem o problema não está naqueles que saem por vontade própria. “O problema é quem gostaria de ficar e é obrigado a construir lá fora o seu projeto de vida.” E ilustra essa realidade com um exemplo comum: “Um estudante que conclua hoje o curso vai provavelmente receber menos de €1000 líquidos por mês. E um T1 no Porto supera esse valor.”

“Portugal gastou mais de €411 mil milhões nesta geração e os nossos melhores estão a sair do país”, diz o presidente da Federação Académica do Porto

Mais do que um problema dos jovens, este é um flagelo para o país. “O facto de mais de metade dos estudantes querer emigrar vai gerar um país mais pobre, menos inovador, mais envelhecido e com grandes dificuldades ao nível das contas públicas”, antevê o presidente da FAP. “O efeito irá notar-se a nível demográfico com o envelhecimento da população que acentuará o impacto nos domínios da inovação e do empreendedorismo e poderá levantar problemas adicionais à sustentabilidade da Segurança Social”, conclui Francisco Porto Fernandes.

Semana de quatro dias

Os dados deste estudo foram partilhados com o Governo e com os partidos. Face a este cenário, a Federação Académica quer ser ouvida pelo primeiro-ministro, pela ministra da Juventude e pelo Presidente da República. Francisco Porto Fernandes apela ao chefe do Executivo, Luís Montenegro, e ao líder da oposição, Pedro Nuno Santos, “para que possam sentar-se e estabelecer pontes”, sublinhando que o problema não se resolverá com “medidas avulsas”. É necessária “uma mudança estrutural para reter os jovens”, frisa o presidente da FAP.

“Não é com o IRS Jovem, com o Programa Regressar ou com a devolução das propinas que vamos conseguir mudar alguma coisa. Precisamos de uma mudança de fundo”, advoga o estudante de Economia, de 22 anos, que defende quatro pilares fundamentais para estancar a perda de jovens talentos. “As nossas propostas apontam em quatro direções: valorização dos salários, acesso à habitação, melhoria da qualidade de vida e aposta na ciência”, sustenta.

A par de melhores salários, os jovens ambicionam ter um melhor “equilíbrio entre a vida profissional e pessoal”. Nesse sentido, o dirigente defende que “é preciso caminhar para o modelo da semana de trabalho de quatro dias e para modelos híbridos de trabalho”.

 

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