Um Verão inteiro
- Público - Edição Lisboa
- Miguel Esteves Cardoso
Hoje é aquele dia em que ainda falta o Verão inteiro. Tudo aquilo que se planeou fazer no Verão de 2025? Ainda vamos a tempo de o fazer. Nem acredito: falta o Verão inteiro. Ainda temos o Verão inteiro para gozar. Ainda não sabemos se vai ser o melhor Verão de sempre. Ainda pode ser.
Daqui a uns anos, podemos estar todos a lacrimejar e a decidir que perfeito, perfeito foi o Verão de 2025. Não esteve calor a mais. Não houve mosquitos a mais. Não houve turistas a mais. As noites foram tão boas como os dias. Todos os nossos amigos apareceram. Almoçámos e jantámos sempre bem, na mesma tasquinha que depois fechou para sempre. Temos o Verão inteiro, mas as perguntas portuguesas já raspam as solas nos bastidores, doidas para entrar em cena.
Durante quanto tempo vamos ter o Verão inteiro à nossa frente? Ah pois, porque isto do Verão inteiro só dura um dia ou dois, porque, mal adormecemos, o crocodilo do tempo abre as mandíbulas e — zás! — já nos comeu mais um dia. Será que temos mesmo o Verão inteiro, mesmo hoje, dia 21 de Junho, data do solstício do Verão? Espere aí: a que horas adormeceu ontem à noite? É que o Verão começou quando faltavam 18 minutos para as três da manhã. Às 2h43 já não havia Primavera para ninguém.
Já estávamos no Verão — e nós a dormir. Típico!
Não só já não temos o Verão inteiro como passámos as horas mais importantes do Verão — as primeiras, que mais precisavam da nossa companhia — a dormir, a dormir depois de adormecermos estupidamente, a pensar: “Amanhã já é Verão.” O exemplo para desperdiçar o Verão já está dado.
Não passamos um terço do dia a dormir? É por isso que o Verão nos parece curto: só sobram dois mesinhos. Para mais, que mal que se dorme no mês de Verão que passamos a dormir, sempre a escolher entre o calor e o barulho, entre a luz e o escaldão, entre as melgas e o ladrar dos cães.
Depois dizemos: “Ainda é Junho. Junho ainda não é Verão.” E “O meu Verão só começa em Agosto”. Mas é um Verão inteiro na mesma.
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