O prazer de pousar e trocar
- Público - Edição Lisboa
- Miguel Esteves Cardoso
Não acredito que os telemóveis não façam mal aos olhos. E a Apple também não: se o iPhone não faz mal aos olhos, porque é que não se cansa de incluir serviços para proteger a vista, como o Screen Distance que apita quando se aproxima demais dos olhos?
Toda a gente que abusa da leitura do telemóvel — a mim chega-me hora e meia — sente nas órbitas o mal que nos faz aos olhos.
Aposto que acontece o mesmo a quem olha para uma vela acesa. Não é bom olhar para uma fonte luminosa — mesmo a de Belém faz mal aos olhos.
Também não é bom olhar para uma coisa tão pequena, com letra tão pequena, e ter de estar sempre a dar à manivela, como se tudo estivesse impresso num rolo de papel higiénico.
Os olhos são como nós: precisam de variar. “Variar ou avariar” poderia ser o lema deles.
Também não é bom passar o dia preso ao mesmo livro, mesmo que se leia à luz do dia. A luz do dia também é tramada quando bate na página branca e os livros, ainda por cima, tendem a ser impressos com tinta manhosa.
A única solução é variar o que se lê. Quanto mais livros, revistas e jornais (e telemóveis e tablets e portáteis) se estiver a ler, melhor.
O erro é ler cada coisa do princípio ao fim. Deve-se ir alternando.
Em vez de carregar o mesmo telemóvel para toda a parte, deve-se ter uma coisa para ler em cada poiso. Quando nos levantamos, a leitura fica interrompida e aquele livro fica à espera que voltemos àquele lugar.
Há um grande prazer em pousar um livro, ou uma revista, ou um iPad. Ficam associados a um sítio — e, como tal, a uma certa hora do dia.
Tenho livros que leio quando acordo, outros para depois do pequeno-almoço, outros para antes do almoço e por aí a fora, conforme os meus movimentos.
O ideal é não transportar coisas para ler. O telemóvel, por exemplo, é bom para quando não se está em casa. Como é preciso transportá-lo, aproveita-se e usa-se para ler.
Pousar e trocar não é só um prazer para os olhos.
A cabeça também gosta de saltar.
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